quarta-feira, 3 de março de 2010

Elomar Figueira Mello

"que haverá de chegar um tempo de baixar os muros e levantar os munturos - vivemos o tempo do culto às nulidades." - Elomar


Outro dia, conversando com o grande amigo Leonardo Aquiles, ele me perguntou: "você não conhece Elomar, Xangai, Vital Farias?. Esses caras são incríveis". Na época conversávamos sobre uma nova forma de fazer música e sobre experimentação de sons, o que mais tarde se transformou no Forrodélicos da Cohab de Madeira, nosso grupo de música experimental. Coincidentemente, lia As Vinhas da Ira de Steinbeck, que romancia a trágica história dos retirantes (tão retirantes quanto os nossos do nordeste) de Oklahoma em direção à Califórnia.

Fiquei com esses nomes na mente: Elomar, Xangai, Vital farias. Fui atrás e achei obras que, junto com todas as outras coincidências, mudaram completamente a minha vida.

Em especial, hoje, quero falar de Elomar Figueira Mello. Nascido nos idos de 1937 em Vitória da Conquista no estado da Bahia, ele é o primogênito de uma jovem e simples família. O pai era tocador de boiada e a mãe costureira.


Durante toda a infância, Elomar esteve imerso na realidade "sertaneza" (como ele gosta de dizer em linguagem dialetês). Acompanhou de perto as secas cíclicas do sertão, feita de homens de passagem, homens da terra, retirantes. Aos sete anos teve contato com a música profana de menestreis errantes que cantavam tiranas e parcelas na região.

Suas primeiras composições começou aos 17 anos, mas ainda sem uma identidade musical.Para a época e pra família, música era coisa de vagabundo, por esse motivo, vai a Salvador para fazer o Científico (que eu não fazia a mínima ideia do que poderia ser, mas a Andarilha, gentilmente me explicou: "No nordeste, 'cientifico' é o nome dado ao ensino médio, antigamente.Também chamado de segundo grau e colegial posteriormente" - Obrigado Andarilha). Mais tarde, gradua-se na segunda faculdade em arquitetura e vai levando a vida, já casado, como arquiteto e músico em Vitória da Conquista.

Quando fui para a Bahia, estava com a intenção de encontrá-lo, uma vez que é um vivo homem e eu ia para a cidade  onde hoje guarda a cultural Casa dos Carneiro. Nesse meu intento, no meio do sertão de Várzea D'água, não consegui fazer contato com Elomar, mas conheci seus amigos. No trago de uma pinga e no vai de um bom papo, Cori, seu amigo íntimo, me contou que certa vez, Elomar, resolveu dar carona para um rapaz que andava pelo lajedão. O rapaz estava com um disco do Michael Jackson nas mãos e apresentou a Elomar perguntando se ele conhecia. E Elomar respondeu: "Você conhece Elomar Figueira, musicólogo, estudioso, concertista de opera e músicas sertanejas?". O rapaz respondeu que não. No mesmo instante, freou o carro, abriu a porta e mandou o jovem descer, dizendo: "Como você conhece Michael Jakcson e não conhece o Elomar que está na sua frente?". Causos que ouvíamos rindo sob uma lua que jamais me esquecerei.


A poesia de sua composição é espetacular. Inspirado nas canções sertanejas, em composições medievais,  barrocas, em literatura de cavalaria e no cristianismo, típico daquela região, sua música chega num grau extraordinário de existencialismo e harmonia.

"Apois pro cantadô i violero
Só há treis coisa nesse mundo vão
Amô, furria, viola, nunca dinhero
Viola, furria, amo, dinhero não

Cantado di trovas i martelo
Di gabinete, lijêra i moirão
Ai cantado já curri o mundo intero
Já inté cantei nas portas di um castelo
Dum rei qui si chamava di Juão
Pode acriditá meu companhero
Dispois di tê cantado o dia intero
O rei mi disse fica, eu disse não" - Trecho de violeiro - 1972

Sua contribuição para a música mundial é incalculável. Na esperança que esse grande mestre de 73 anos seja ainda consagrado vivo, deixo aqui a minha a homenagem a ele, que hoje vive numa fazenda, ainda em Conquista, cuidando de seus bodes e compondo enquanto tiver forças. Ele mesmo confessa que "tem de escrever sem perda de tempo, pois que a obra é imensa e o tempo já declina pela tarde (...) onde o aguarda uma geração que, por justiça, haverá por certo de ouvir e amar sua música tão fora de moda nestes dias. Ó Tempora! Ó Mores!".

Sua obra está distribuída pela internet. Abaixo segue o site, pelo qual extraí alguns dados e donde você poderá encontrar muito mais informações, bem como a discografia completa.

http://www.elomar.com.br/

Se tiverem interesse, continuem vendo os outros filmes. É bárbaro.


3 comentários:

  1. Massa minino! gostei da lembrança de elomar! Isso é muito legal..Tu mostrar para as pessoas um pouco da nossa cultura e de tantos grandes artistas que estao por aí, contando seus causos, fazendo versos e prosas compartilhando sua arte e largando mão do dinhêro! Legal tu compartilhar!To achando muito bonito isso viu? muito bom, muito bom..E vital, hein? o tal poeta que encanta? Continue iluminando por ai! Um Xêro!

    Obs: No nordeste, "cientifico' é o nome dado ao ensino médio, antigamente.Também chamado de segundo grau e colegial posteriormente.

    ResponderExcluir
  2. SOU CONTERRÂNEO DO MESTRE ELOMAR E FICO GRATO POR SABER QUE PESSOAS COMO VOCÊ E MUITOS OUTROS DE OUTRAS REGIÕES E PAÍSES PRESTAM HOMENAGEM A ESSE ÍCONE DA CULTURA CERTANEZA.
    PENA SABER QUE EM MINHA CIDADE POUCA GENTE O CONHECE. QUE DIRÁ SUA OBRA. CERTAMENTE OUVIRÃO FALAR DELA QUANDO EM ALGUM NOTICIÁRIO GLOBAL REPORTAR A SUA PASSAGEM D´ALÉM TERRA, E TRAGICAMENTE COMENTARÃO:.."OXE, NEM SABIA QUE ERA DAQUI DA CIDADE".

    ResponderExcluir
  3. Caro Anônimoo...Também sou conterrâneo seu,e do Menestrel Elomar...Tive a gratíssima felicidade de conhecer,ainda que pouco,sua obra desde miinha tenra infância...Agradeço ao meu pai,que desde cedo me ensinou a gostar da boa música,e nessa classificação,claro não poderia faltar jamais as obras do Grande Elomar! É realmente uma pena que ele seja tão pouco conhecido,em sua própria terra natal,ainda mais em tempos em que carecemos de música de verdade,a qual apenas encontramos,infeliz e felizmente,fora da grande mídia...

    Agradeço ao autor desse Blog,por homenagear,nesse espaço esse grande nome que é Elomar...

    Tenho Orgulho de bradar : Sou da Terra de Glauber e de Elomar ! *-*
    Saudações Sertanezas!

    ResponderExcluir

Não me procure se não for importante